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9 de dezembro de 2011

Títulos de campeão brasileiro antes de 1971 são válidos?

Quero saber se posso entrar na justiça contra os títulos de campeão brasileiro que foram dados pela CBF para o Flamengo, o Santos e o Palmeiras antes de começar o campeonato brasileiro em 1971?
Inácio
Osasco/SP

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Olá Inácio

A Confederação Brasileira de Futebol (CBF) é a entidade que tem competência para organizar o campeonato brasileiro entre seus filiados e o poder para determinar quem é o campeão brasileiro de determinado ano.

No entanto, esse poder não é absoluto e está limitado pelo interesse jurídico das agremiações e dos torcedores, visto que o futebol é um importante elemento de nossa cultura.

O argumento utilizado pelos clubes favorecidos é que na época esses torneios reuniam as melhores equipes do Brasil e eram vistos como verdadeiros campeonatos nacionais.

Um contra-argumento possível é que o titulo de campeão brasileiro não poderia ser conferido retroativamente, sem que, antes de cada um dos campeonatos para os quais a CBF atribui o título de campeão a esses clubes, houvesse uma clara e expressa declaração e intuito de que aquele torneio – como o Roberto Gomes Pedrosa e a Taça Brasil – era de fato um campeonato brasileiro cujo vencedor seria declarado campeão brasileiro.

Isso afeta inclusive o ânimo com que um determinado clube participa de uma competição, visto que os calendários são apertados e os clubes precisam definir prioridades e avaliar seus interesses em cada certame. Os clubes, sabemos, vivem de sua história, de suas tradições, e é com esse ânimo que participam com mais ou menor intensidade de cada competição.

Ou seja, ninguém poderia ser surpreendido depois de algumas décadas ao ser informado que aquele torneio regional de que participou ou aquela copa para a qual não deu tanta atenção era o campeonato brasileiro.

A Constituição Federal, tanto em seu preâmbulo quanto no cabeçalho do artigo 5º., consagra o principio da segurança.

Esse princípio tem interpretação ampla, abrangendo a segurança jurídica, ou seja, a vedação a que os jurisdicionados sejam surpreendidos por manipulações tanto nas relações com outras pessoas quanto nas relações com o Estado, entes associativos, empresas e quaisquer outros integrantes da nossa sociedade.

Por esse prisma, a CBF teria que demonstrar de forma clara e inequívoca que ao organizar aqueles torneios o fazia com o ânimo de serem o campeonato brasileiro e que seus participantes tinham plena consciência disso.

Essa garantia está expressa no Estatuto do Torcedor (Lei 10671/2003):

Art. 5o São asseguradas ao torcedor a publicidade e transparência na organização das competições administradas pelas entidades de administração do desporto, bem como pelas ligas de que trata o artigo 20 da Lei 9615 de 24 de março de 1998.

Embora o Estatuto do Torcedor não possa ser aplicado retroativamente àqueles torneios, seus princípios sim, e afetam a declaração da CBF posterior à promulgação do Estatuto, visto que a não surpresa, a publicidade e a transparência ou boa fé nas relações interpessoais ou sociais se aplicam intemporalmente.

Evidentemente, atribuir títulos com alcance maior a torneios realizados no passado não atende ao requisito do artigo supracitado.

Para contestar esses títulos, você pode seguir dois caminhos: uma ação comum, em que você, como autor, invocaria o artigo supracitado do Estatuto do Torcedor e outros fundamentos pertinentes, ou uma ação civil pública.

A ação civil pública, prevista na Constituição, foi instituída efetivamente pela Lei 7.347 de 1985. Entre suas finalidades está a preservação dos “bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico”.

Os direitos protegidos pela lei de ação civil pública são direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos, ou seja, no primeiro caso, direitos cujos titulares não podem ser determinados, no segundo, direitos de uma comunidade de pessoas e, no terceiro, direitos individuais que decorrem de um fato comum. No caso, se for invocada a preservação dos valores históricos, porque o futebol faz parte da cultura e da história de nosso país, trata-se de um direito difuso.

Como pessoa física você não pode ajuizar esta ação, mas pode fazê-lo, por exemplo, mediante alguma associação de torcedores constituída há mais de um ano ou submetendo uma representação ao Ministério Público com a descrição do fato e as razões do seu inconformismo.
O Ministério Público analisará então a sua representação e poderá ajuizar a ação.

Um caso diferente seria o de a CBF conferir títulos apenas simbólicos, como de “campeão honorário”, aos ganhadores do Torneio Roberto Gomes Pedrosa, que era uma versão expandida do Rio-São Paulo, e da Taça Brasil, cujo objetivo era apontar os representantes do Brasil para a Taça Libertadores da América.
No plano internacional, é de se observar que a FIFA não considera campeões mundiais os campeões da disputa bicontinental que reunia o campeão da Libertadores e o campeão da Europa, exatamente porque essa competição nunca foi anunciada com o ânimo de ser o Campeonato Mundial Interclubes, que só se iniciou oficialmente no ano 2000.

No entanto, a FIFA concedeu retroativamente o título de campeão mundial a um clube brasileiro que venceu em 1951 a Copa Rio, um torneio organizado pela antiga Confederação Brasileira de Desportos e que a FIFA não declarou expressamente que indicaria o campeão mundial.

São coisas do futebol...

1 de dezembro de 2011

Posso abrir conta-corrente com nome "sujo" ou pendência no CPF?

Os bancos têm direito de negar que eu abra uma conta-corrente porque meu cadastro no CPF apresenta pendência?

Posso abrir uma conta-corrente estando com o nome apontado no SPC, ou só posso abrir conta-poupança?

Ana G., Santo André/SP

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Olá, Ana.

A abertura de conta bancária é exercício de direito da vida civil, permitido diretamente a todos que tenham capacidade ou, indiretamente, aos representantes ou curadores dos absoluta e relativamente incapazes (Código Civil, arts. 1 a 6) , tendo pertinência com a segurança e a facilidade da vida social.

Embora o CPF e demais dados de identificação sejam necessários para a abertura de conta corrente por normas do Banco Central, não há motivo para negar a abertura de conta bancária quando a consulta ao cadastro do CPF apresenta pendência.

Essas pendências geralmente se referem à falta de entrega de declarações de imposto de renda, divergência nas declarações e até mesmo à existência de débitos fiscais.

A Receita Federal utiliza esse recurso para fazer com que o contribuinte se dirija a um de seus postos para regularizar sua situação fiscal.

No entanto, sendo as relações do fisco com o contribuinte de direito público-administrativo, eu sua vertente tributária, não podem impedir o cidadão de praticar os atos da vida civil, em suas relações de direito privado, uma vez que o fisco dispõe dos meios próprios para fazer os contribuintes cumprirem suas obrigações fiscais principais (pagamento de impostos, etc.) e acessórias (entrega de declarações, etc.), na forma de execuções fiscais e imposição de multas.

No caso de apontamento no SPC ou no Serasa, também não há razão para o banco negar a abertura de conta-corrente, visto que essa se destina à proteção do patrimônio do cidadão, e o impedimento abertura caracteriza ofensa ao princípio da segurança, estatuído no artigo 5o. da Constituição Federal, que admite uma ampla interpretação ampla como os demais direitos e garantias constitucionais.

De outra perspectiva, se, por um lado, os bancos procuram com a negativa evitar a entrega de talão de cheque ao correntista com histórico de inadimplência, como uma forma de proteção á boa-fé pública, por outro, a conta corrente pode ser movimentada mediante cartão de débito ou saque na agência, afastando o risco social de abuso do sistema de ordem de pagamento á vista, que é o que representa o cheque, visto que o cheque “pré-datado” não tem respaldo jurídico e pode ser apresentado imediatamente pelo portador.

Mesmo o correntista que passa cheque sem fundo não tem sua conta encerrada automaticamente por esse motivo, mas é apenas impedido de obter talão de cheque.

A título de informação, alguns bancos públicos têm aceitado a abertura de conta corrente por clientes com apontamento nos serviços de proteção ao crédito, tendência que deverá ser seguida pelos demais bancos.

Para mais detalhes e informações sobre os procedimentos judiciais a serem adotados para garantir a abertura de conta corrente em ambos os casos, consulte um advogado de sua confiança.

Abs.