Sou obrigado a ficar com o carro pelo preço de um novo no
fim do contrato de leasing de cinco anos?
A. Araújo (SP)
................
Bom dia!
Há várias modalidades de leasing, sendo as mais conhecidas o
leasing operacional, em que uma empresa arrenda um bem sem intenção prévia de
adquiri-lo, mas podendo fazê-lo no fim do contrato, sempre ao preço de mercado,
por expressa determinação normativa, e o leasing financeiro, no qual uma
instituição financeira autorizada pelo Banco Central a atuar no mercado de
leasing, mediante uma empresa especialmente destinada a essa finalidade,
adquire a propriedade de um bem para arrendá-lo ao consumidor.
Segundo a Resolução 2.309/96 do Banco Central, que regula as
operações de leasing, os contratos de leasing devem ter algumas cláusula
obrigatórias, entre as quais as que definam o valor da contraprestação (que é o
preço mensal do arrendamento), que deve servir para cobrir todas as necessidades
de lucro da arrendadora, e as condições
para a opção de compra ou devolução do bem ao final do contrato.
O inciso III do artigo 5º. da referida resolução diz que,
entre os elementos do contrato de leasing financeiro, deve haver cláusula de
opção de compra livremente pactuada,
podendo, inclusive ser exercida a preço de mercado.
No entanto, o que se observa é que nos contratos de leasing financeiro
não existe livre negociação, pois geralmente são contratos de adesão, nos quais
o consumidor só tem a opção de aceitar ou não o contrato em sua integralidade.
Desta forma, os contratos acabam fixando cláusulas que estipulam que, no caso
de o consumidor não notificar a arrendadora até certa data do término do
contrato de que deseja devolver o veículo, deverá exercer a opção de compra
pelo montante total do VRG- Valor Residual Garantido.
O VRG foi inserido nos contratos de leasing financeiro como
uma espécie de caução para o exercício da opção de compra no final do contrato.
Há alguns anos, o Superior Tribunal de Justiça considerava que essa cláusula de
antecipação do preço da opção de compra mediante a determinação do VRG
descaracterizava o contrato de leasing para equipará-lo a uma operação de alienação
fiduciária com a garantia do bem, que ficava alienado à financeira até o
pagamento de todas as parcelas. Mais tarde, o STJ mudou seu entendimento para
considerar que o VRG tinha natureza de caução e, portanto, não descaracterizava
a operação de leasing.
No meu entender, se o VRG é uma caução para a compra do bem,
e se o artigo 5, III da Resolução 2309/96 diz que a opção pode ser exercida a preço de
mercado, o consumidor tem esse direito no caso de não ter havido livre negociação prévia ao contrato, especialmente porque
a cláusula predefinida que o obriga a ficar com o bem pelo total do VRG colocara o consumidor em situação desvantajosa. Isso se dá não somente no seu próprio contrato, mas també, comparativamente, em relação aos consumidores que optam por devolver o bem e receber de volta a caução
na forma do VRG ou, ainda, daqueles que se tornam inadimplentes e têm a
possibilidade - reconhecida pelos tribunais - de receber de volta o VRG depois
de deduzidas as parcelas devidas até a data da apreensão do veículo.
Há, no caso, uma clara ofensa ao princípio constitucional da igualdade
e aos princípios gerais de direito como o princípio da razoabilidade e o princípio da proporcionalidade nesse tipo de
obrigação contratual. Aplica-se, portanto, a norma do Código de Defesa do Consumidor
(art. 51, inciso V) segundo a qual são nulas de pleno direito as cláusulas
contratuais abusivas e que gerem desvantagem ao consumidor.
Por outro lado, do ponto de vista contábil, valor residual
significa o preço que um bem conserva após sua depreciação.
A legislação
do Imposto de Renda estabelece percentuais de depreciação para vários tipos de
bens, que devem ser aplicados anualmente nos balanços das empresas. Por exemplo, o percentual de depreciação de
um imóvel (construção, não o terreno) é de 4% ao ano, e o de bens móveis como
veículos, máquinas e equipamentos é de cinco anos. Significa que, após serem
depreciados contabilmente por cinco anos, os veículos não têm mais valor contábil.
No entanto, como é notório, ainda mantêm um valor de mercado, que tecnicamente
é chamado de valor residual. Se a empresa vender o veículo por esse valor
residual, deverá lançar o montante apurado como receita.
Deste modo, a expressão valor residual garantido só faz
sentido se essa forma de caução - e destinar à cobertura da aquisição do bem
pelo valor residual, não pelo valor total do bem na data inicial do contrato.
É possível, portanto, se o contrato ainda estiver em andamento,
ajuizar uma ação de revisão de cláusula contratual para garantir que você possa
exercer a opção de compra ao final do contrato pelo valor que o bem tiver na
data da opção, usando como referência a tabela FIPE, que é geralmente aceita
como parâmetro confiável de avaliação, ou requerendo avaliação pericial. Desse
modo, o seu pedido será para receber de volta o valor da caução representada
pelo VRG, abatendo dele o preço de mercado do veículo na data da opção de compra.
Se o contrato já foi cumprido, ainda assim será possível
ajuizar, a qualquer tempo, uma ação declaratória de nulidade de cláusula
contratual com o pedido cumulado de restituição da diferença, nos mesmos termos
acima, visto que não há prazo prescricional para a declaração de nulidade.
Para informações mais detalhadas sobre as questões processuais pertinentes,
procure um advogado especializado em direito bancário (muitas vezes
equivocadamente chamado de direito financeiro, que é o ramo do direito que
cuida do orçamento do Poder Público) para ajuizar a ação cabível, visto que há
enormes chances de você não conseguir exercer esse seu direito amigavelmente
com as operadoras de leasing.
abs
LEASING, CO